Deixei finalmente os afazeres, as prisões do dia a dia e hoje retornei ao local onde nasci, à fazenda onde fui criado. A emoção me acompanhou desde as primeiras horas do dia e aqui estou confrontando as imagens atuais com as lembranças que guardei comigo no cantinho mais seguro do coração.
Depois de tantos anos, tudo está diferente: a casa reformada, outro curral, novas plantações, o espaço em volta. No entanto, foi só fechar os olhos e revivi o lugar exatamente como era. O paiol, o chiqueiro, o canavial, as imensas mangueiras cobrindo o chão com sua sombra fresca onde a gente descansava nas tardes quentes de domingo... Na ponta da bica d’água, o monjolo; mais à frente o engenho rodando, rodando como os ponteiros de um relógio. E, assim como certo poeta, também reencontrei um córrego, o mesmo que por tantos anos me acolheu para brincar nas pedras que cortam o seu leito.
O quintal da sede é o que mais me chamou a atenção. Parece muito pequeno, mas é idêntico ao da minha infância, tenho certeza disso. Senti-me novamente criança, e percebi que nessa idade, na constante tarefa de conhecer a vida, de se relacionar com o mundo, a gente acha tudo maior do que realmente é na verdade. Para mim, nessa época, o quintal era imenso, tinha todo o espaço necessário para executar as costumeiras traquinagens, para correr montado em meu cavalo de pau, rústico brinquedo feito de cabo de vassoura com um cabresto de couro na ponta. Lembro-me que, após um grito de incentivo, minha montaria, me levando em suas costas, pulava o cercado e invadia repentinamente o seco milharal. Eu levantava a velha espada de madeira, pondo fora de combate diversos inimigos. Depois voltava triunfante para a sombra da velha moradia, meu reduto.
As pessoas que hoje aqui residem são outras, mas me receberam muito bem, talvez respeitando o meu olhar melancólico e o meu andar vacilante adentrando o local no ritmo da nostalgia, pisando com cuidado e respeito o chão que havia me criado. Ofereceram-me um café e aquele cheiro me sufocou de saudade. Não escondi o meu aperto; corri até a janela e me debrucei, feito criança, diante do grotão de mata fechada onde se esconde o sol. Ali fiquei por alguns minutos, ou horas talvez. Desse lado chegavam as primeiras chuvas, e os olhos de esperança de meu pai estavam sempre voltados nessa direção, ano após ano, até que ele se foi. Assim é a vida, seguimos contando os anos, sem verdadeiramente saber quantos são.
Se eu pudesse fazer um pedido aos Céus, queria que todas as pessoas voltassem um dia ao lugar onde nasceram. É uma emoção indescritível, um presente de inestimável valor. Para mim, para todos nós, fica clara a certeza de que a melhor parte da vida vivemos primeiro.