Nas entranhas deste trânsito complicado de nossa cidade, surge frequentemente uma cena interessante, engraçada e até certo ponto perigosa: duas mulheres numa moto! No meio da costumeira agitação, pode até mesmo parecer normal quando elas aparecem, mas nem precisa ter olhos atentos para notar a extravagância que aprontam.
Tudo começa pela necessidade que o sexo feminino tem de conversar. Essa comichão na garganta não permite que as referidas criaturas terminem o trajeto para depois colocar o papo em dia, assim passam a ter um comportamento diferente dos outros motociclistas. Para começar, a acomodação sobre o veículo de duas rodas, quando a carga é feminina, exige um comportamento singular. A condutora que vai à frente senta-se meio de lado, com uma das orelhas em riste, pronta para iniciar o diálogo. A garupeira se atraca em sua costela, como no acasalamento de certos animais e encosta os capacetes, grudando-os o máximo possível, para facilitar a passagem das letrinhas que formam as palavras gritadas por elas. E pasmem os senhores! Se alguma mensagem não puder ser entendida, é repassada rapidamente via WhatsApp, pelo inseparável celular que levam em uma das mãos.
Assim a moto começa a rodar, e logo uma das mulheres dispara urros estridentes por dentro do capacete para que possam ser ouvidos pela parceira no interior do outro capacete em movimento, atrapalhada ainda pelo ronco do motor da motocicleta e os demais ruídos da via por onde trajetam. Em seguida vem a resposta com a mesma dificuldade de comunicação. Dessa forma, a cidade inteira fica sabendo dos assuntos referentes àquele dia: os destaques da moda, a agenda das festas, as fofocas dos namorados e dos amigos, as intrigas da família e dos vizinhos, os absurdos das novelas, os “nudes” da internet, os desacertos de Neymar e Marquezine, as maledicências de todo mundo.
Se colocar música de fundo quando uma dupla dessa aparece no início da rua, dá para imaginar que é um desses carros de propaganda volante anunciando a chegada do Natal ou, se o assunto for mais sério, de chifre por exemplo, a gente pode pensar que se trata de uma daquelas costumeiras notas fúnebres que irradiam por aí.
Na verdade é o maior castigo para duas mulheres subir juntas numa moto. Não é fácil para elas saber que a colega está tão perto, e as palavras todas ali presas pela fivela do capacete. Dá vontade de jogar aquele estorvo fora e deixar os cabelos e as frases voarem soltos ao vento, mesmo que depois tenham que terminar o assunto na cadeia...