Há inúmeros pertences que valorizo, e poderia enumerá-los aqui demonstrando sua utilidade, alguns até de custo mais elevado. Entretanto nenhum deles tem a importância que dispenso ao meu... Bem, ao meu vaso sanitário. Ele mesmo, branquinho, limpinho, cheiroso, com tampa de almofada, coisa de primeiro mundo!
Meu vaso é companheiro diário, está sempre à minha espera, pronto para me receber. Quando abro a porta do banheiro, já vejo sua boca aberta para mim com todo tempo à disposição, mesmo quando chego com um jornal aberto na página de esportes ou uma revista de palavras cruzadas nas mãos. E mais: não reclama e nada conta a ninguém. É fiel aos meus bons e maus momentos. Cuido dele com carinho retribuindo seu apreço. Às vezes sento lá, sem uma real precisão, só para estar ao seu lado.
Na verdade, o ato número dois é sempre melhor em nossa casa. Quando a vontade chega e estamos em outro lugar, ficamos naturalmente constrangidos. O toalete é aberto cuidadosamente, com o mínimo de barulho possível, a tampa é suspensa quase que em câmera lenta. Ao sentar dá até para ouvir o estalo do joelho. Ficamos ali perdidos entre a preocupação de terminar logo o serviço e a necessidade de não causar qualquer ruído desagradável que possa revelar nossa presença ou o que realmente estamos fazendo. Passada essa fase, o papel higiênico é utilizado, mas nunca colocado no cesto; vai também para o buraco. Aí vem o momento da descarga revelando a todos, gritando para o mundo a nossa vergonha. Depois saímos enxugando o rosto, passando as mãos na roupa para disfarçar.
Durante uma viagem, seguro a barra enquanto posso, pois não dá para encarar com a bunda aqueles vasos sujos e fedorentos dos banheiros públicos. Tem vez que até me esforço na utilização para aguentar tranquilo mais alguns quilômetros de estrada. Limpo a beiradinha de um deles, sento, espremo, engrosso a veia do pescoço, mas em vão. Parece que comprimo o orifício e nada sai. Fico ali minutos assuntando o movimento dos passos entrando e saindo das outras latrinas, dá até para ler os versinhos da parede, e nem um punzinho acontece.
Não sei com vocês, mas quando tenho que passar um tempo maior distante de casa, a trabalho ou a passeio, acontece comigo algo interessante. Sem poder contar com meu vaso sanitário, a vontade demora aparecer. Já passei três dias seguidos sem “soltar o barro”, e alimentando naturalmente, talvez até mais. Cheguei a pensar que estava doente, mas logo entendi o que estava acontecendo: o problema era a saudade do meu vaso branquinho, limpinho, cheiroso...
Temos o costume de valorizar as coisas quando as perdemos ou quando estamos distante delas. Esse pecado não vou cometer com meu vaso sanitário. Obrigado, meu grande amigo!