Doce Recordação
Quando a noite se entristece e chora, tímida e silenciosa como se quisesse esconder seu pranto, e o dia amanhece surpreso, encontrando o ar frio e o chão molhado, eu me lembro do despertar de minha vida...
É a minha mais doce recordação. Doce, pois tudo o que se vive na infância só pode ser... doce. E eu me lembro. Louco pela vida, ultrapassava a porta que me prendia entre as paredes, e corria sobre os ramos do caminho. Saudava as plantas coradas do verde mais bonito, me deliciava com o perfume que ninguém conseguiu ainda prender num frasco, pisava a terra úmida, deixando rastos de felicidade. A minha alegria podia ser comparada à alegria dos pássaros que sacudiam suas penas, cantavam seu amor à natureza, pousavam na areia da estrada e faziam lindos desenhos com seus pequenos passos. Na verdade, a criança é um pássaro que voa no pensamento.
Na magia daquela manhã, eu seguia, esbarrando-me nas folhas molhadas, colhendo frutos maduros, pisando as poças d’água, fazendo novas amigas borboletas. Em cada curva havia um novo mundo, um mundo de beleza sem igual. Eu voltava os olhos para o céu e mergulhava nesse infinito de encontro a preguiçosos pingos de chuva que ainda caíam - poucos, mas tão belos, colorindo-se nos raios de sol que venciam as nuvens: pérolas do céu. Eu fazia parte desse bailado, e um pingo no meu rosto era para mim um beijo de Deus.
Eu me lembro. Não há como esquecer, e em cada dia assim, vejo que não soube, nesses anos todos, guardar comigo a alegria de viver. É uma pena... acontece com todo mundo.