Missão do chefe: servir
Nada se adianta em imaginar que mandar é fácil, que, com um rosto hermético e uma voz imperiosa, está ganha a batalha. Para ser chefe, há que possuir aquele amor do próximo e aquela cultura que permitem conhecer os homens e perscrutar os mais íntimos recônditos da alma. Torna-se necessário pertencer também àquela aristocracia espiritual que tem por divisa: servir. Mas servir desinteressada, perseverante e corajosamente - consequência de convicções, entusiasmo, caráter.
Para viver, um país tem necessidade de que os indivíduos escolham uma doutrina e a conservem, se fixem uma regra, um lema. Eu escolhi, impus-me uma disciplina: “Servir” (Weygand).
Toda a autoridade vem de Deus, mas é dada ao chefe em benefício dos outros e não em benefício pessoal.
A autoridade pode definir-se: direito de ordenar aquilo que é mais conforme ao interesse geral da sociedade.
O chefe não cumpre a sua missão senão na medida em que, ao bem pessoal, antepõe o bem comum e ao interesse particular prefere o interesse geral.
O verdadeiro chefe não procura dominar por dominar. Não se serve dos homens, mas auxilia-os a servir uma causa que os supera; familiarizar-se com a obra a cumprir constitui o primeiro elemento da alma do chefe.
Mandar é servir: servir a Deus, em nome de Quem se exerce o poder - porque toda a autoridade que, em última análise, não O tenha como fundamento é ilusória ou usurpação; servir aqueles que se comanda, os quais sem chefe correriam o risco de ser um rebanho sem pastor; servir a causa que nos supera e merece a adesão, a obediência e, se for preciso, o sacrifício próprio.
Que bela missão a de ser chefe! É até mais do que uma missão: é uma vocação, um chamamento, uma espécie de predestinação. Porque “toda a autoridade vem de Deus”, o que exerce a função de chefe torna-se como que um intermediário entre Deus e os seus subordinados. O texto escriturístico não admite restrições nem reservas. É-se chefe “em nome de Deus”, e unicamente para fazer com que os outros homens se tornem mais semelhantes a Ele, ajudando-os a tornarem-se mais homens, a tomar consciência da sua dignidade de criaturas divinas, a desenvolver os talentos que providencialmente lhes foram distribuídos (Mgr. Pinson, Bispo de Saint-Flour).
A autoridade é um serviço, mas um serviço magnífico. Consiste, não em favorecer caprichos individuais, mas em fazer com que um grupo humano realize o que a sua missão - e a sua vocação, poderia dizer-se - exige. Além disso, o chefe, mesmo quando resiste a opiniões desvairadas e força o grupo a duros e necessários sacrifícios, nada tem de déspota. Apenas serve, embora como corajoso e leal servidor. A coletividade não tem que reclamar, mas que seguir. E seguirá, tanto mais voluntariamente quanto mais claramente vir que o chefe, apesar da sua rudeza, ou até pela sua rudeza, não pretende levá-la a fazer simplesmente o que ele quer, mas o que ela mesmo quer verdadeiramente, como grupo organizado e não como conflito de egoísmo.
Tendo por objetivo “servir”, o chefe dá, à sua maneira, exemplo de obediência, e, além disso, faz surgir nitidamente diante de todos que tem autoridade para exigir dos outros a procura desinteressada do bem comum.
O chefe não decide arbitrariamente; constitui norma para si procurar a ressonância no mais profundo daqueles que conduz. O chefe não só orienta, ajuda também; que aqueles que sentem em si uma vontade rejubilem: o chefe não é chefe senão para os ajudar a querer.
Para prestigiar-se, basta que a autoridade se exerça segundo a sua razão de ser.
No chefe, o indivíduo deve apagar-se de qualquer maneira e desaparecer na função. Este apagamento, viril e corajoso, confere-lhe um prestígio e uma força que nenhuma outra reserva dá. Tornando-se, mas de modo intenso e visível, pessoa pública, eleva-se, pelo próprio serviço, acima de individualismos estreitos. A sua voz possui um timbre diferente da dos outros: torna-se a voz da consciência moral em busca do bem superior da coletividade.
A autoridade está ligada, sobretudo, à existência e à consciência duma missão superior, de que o chefe tomou o encargo não em proveito próprio, mas para bem daqueles que dirige e dos quais tem a responsabilidade.
O chefe não manda “por prazer”, sem interesse, como um senhor que domina escravos e colhe benefícios do trabalho dos outros. Não. Mas sim para conduzir uma comunidade, por uma engenhosa hierarquização de meios, ao seu alto valor moral. A sua missão domina-o, como uma vocação. Pertence-lhe. Dá-se à sua comunidade - para que ela se volva no que pode e deve ser. Serve. E se está compenetrado do pensamento da sua missão, tomado por essa vocação, votado ao serviço dela, então, e então somente, é um chefe (Dunoyer de Segonzac).
O chefe não é principalmente o que anima, persuade, arrasta, convence, mas aquele que manda em nome da autoridade de que está legitimamente investido, e é para ele a mais nobre maneira de servir. A sua missão é um autêntico serviço social.
Mandar é servir. O chefe está ao serviço da comunidade, mas não quer isto dizer que deva estar às suas ordens: estas não são muitas vezes senão a expressão de seus caprichos ou fantasias, quando não são o fruto de sugestões estranhas, mais ou menos interessadas. Com razão, deve dizer-se do chefe que ele deve ser o intérprete do bem comum; não significa isto, porém, que deva ser o intérprete da vontade geral. Esta, dadas as variações de sensibilidade próprias da psicologia das multidões, não é muitas vezes outra coisa senão a inconstante opinião pública, em frequente contradição com o verdadeiro bem superior do conjunto.
O chefe não é um simples delegado da comunidade, mas o seu guia em persecução dos seus mais altos fins. Mesmo eleito e designado por seus pares, a autoridade de que é o depositário confere-lhe o direito de mandar sem que tenha de usar sempre, para se fazer obedecer, de persuasão e de argumentos pessoais.
Um chefe deve possuir, antes de tudo, o sentimento da sua responsabilidade. Ter o sentimento da responsabilidade não significa que espere ser punido, se não cumpre o seu dever - um verdadeiro chefe não pensa nas sanções em que poderia incorrer a respeito doutros chefes, colocados acima de si na hierarquia. Mas, quanto aos homens a seu cargo, não deseja que sofram inutilmente, sejam injustamente punidos, ou privados do pouco conforto que podem ter. Não deseja que façam três quilômetros a mais, porque as ordens foram mal dadas. Não quer, que, após longa caminhada, vagueiem pelas aldeias onde chegaram, sem saber em que lugar devem acampar, sem possuir um pouco de palha para descansar, sem ter, se é possível, uma sopa quente que os reconforte. Pensa em tudo, por tudo vela; não come nem se deita sem que tudo esteja em ordem. Uma coisa há em que não pensa: na sua própria fadiga. Não sendo escravo de seus superiores, é-o, no entanto, do dever de proteção que deve aos seus. Este sentido da necessidade dos outros torna-o muitas vezes capaz de trabalhos que parecem acima das suas forças (O. Clement).