Foi no tempo em que morava na cidade grande. Eu estava ali, parado, à espera do ônibus. O tumulto de sempre, os mesmos rostos desconhecidos, os mesmos olhares de desconfiança, a pressa e o medo de sempre. Eu não pensava em nada, não fazia nada, não caminhava, não sorria. Não construía um plano, não realizava um sonho. Estava parado; respirava apenas e apertava o embrulho que trazia nas mãos. Não vivia, esperava o ônibus para que a vida reiniciasse.
Veja só! A vida estava atrelada ao trânsito daquele dia, ao empenho e desempenho do motorista. Eu estava jogado à mercê de outros. Usava minha força e minha vontade apenas para apertar o embrulho das mãos. Era apenas mais um entre tantos que nada tinham, nada sabiam, nada queriam. Só mais um que se acostumara a seguir em frente para cumprir um destino que desconhecia, que não fora construído por si mesmo; só mais um esquecido à margem da corrente, excluído pela seleção natural. Um simples grão de areia, sem nenhum brilho, amontoado aos outros na praia dos desenganos. Sobre as cabeças surge um ônibus... não era aquele.
Eu conhecia a impaciência da espera, mas não sabia que era tão forte assim. Parece que a minha se entrelaçara às outras e formara uma teia que cobria a calçada, feito uma prisão onde as mentes se debatiam sem saída. Passa uma criança vendendo alguma coisa e a sua oferta é, na verdade, mais um pedido de ajuda. Seus olhos revelam isso, mas ninguém compra, não doa, nem olha. A atenção está toda na esquina onde a vida vai aparecer a qualquer momento. No entanto ela não chega, para esses nunca vai chegar. Volto e me vejo no espelho de uma vitrina. Meu olhar, perdido no tempo, me repreende. Vejo até onde cheguei, até onde não cheguei.
Explodiu em mim a vontade de pisar outros caminhos. Percebi que o sonho é o mais importante na vida do ser humano, entretanto o tempo passa e a gente espera. Espera por um momento, por um alguém, por um milagre. Um grande erro! É preciso sair e buscar, arrebentar as teias que nos cercam, cortar as amarras e se deixar levar pelo vento que sabe o caminho do Paraíso. Hesitei ainda por um momento, mas, enfim, dei o primeiro passo em direção à liberdade. No instante seguinte senti não ter mais importância o embrulho que tinha nas mãos. Rompi a teia e segui abandonando a espera, construindo novos objetivos, segui em busca de mim.