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O maior pecado

Hoje me senti incomodado. Minha consciência puxou-me a orelha, e ainda está puxando, insistindo para que não me esqueça do ato cometido. Algo assim à primeira vista tão sem importância, mas que não passou despercebido pela minha formação moral. Acho que o meu olhar, visando a minha proteção, se enganou ou se precipitou numa análise feita de alguém. O caso é que meu “pré” conceito, a minha prévia leitura transformou-se em preconceito para minha consciência.

Vamos ao fato. Estava naquele banco costumeiro da praça preferida, à sombra de uma árvore, com o livro da hora nas mãos. Sentava bem no canto, dizendo a quem passasse que, apesar de existirem outros bancos vagos, esse também estava à disposição, como o meu olhar de bom-dia e o meu sorriso de tudo bem. Não, não importava a leitura se alguém aparecesse por ali. O contato com o livro seria logo retomado, o mais importante é o contato humano, mesmo a certa distância, até mesmo só de acenos. Eis então que surgiu, assim de repente, alguém à procura desse contato, talvez. A aparência é que não ajudou. Sujo, despenteado, gesticulando meio louco, e seus loucos gestos me assustaram, me fizeram perder a sensibilidade natural de quem passa dos cinquenta.

Uma única pergunta foi feita e eu disse “não”. Ainda acrescentei “não sei”. Nesse momento é que realmente o vi, pois olhei em seu olhar. Mas, ainda meio sem iniciativa, deixei-o ir sem o meu bom-dia, sem a minha ajuda, sem o meu contato humano. Ele queria saber – veja só – o que era Bolsa-Família e eu disse “não, não sei”. Eu sabia o que era, pra que era, o motivo real do seu existir, as jogadas políticas, a ideologia que representava na sociedade. Participei até de uma discussão a respeito da existência ou não do hífen entre as duas palavras. Eu sabia, meu Deus, e não lhe dei a informação. Poderia lhe indicar o caminho, levá-lo ao local da inscrição, ajudar para que conseguisse uma para si, ou simplesmente matar a sua curiosidade. E eu faria se não fosse o meu “pré” conceito, ou melhor, o meu preconceito.

Entendo a minha consciência. Foi mesmo um grande erro. Sei que, com o tempo, a gente aprende a dizer não; já neguei certos favores, neguei dinheiro, neguei o que realmente poderia e deveria ser negado dependendo da situação, mas nunca em toda a vida havia negado conhecimento. Isso é inadmissível, imperdoável! A história da humanidade conta que os saberes eram repartidos por aqueles que detinham certa cultura. Mais que um prazer, o ato era visto como uma obrigação. Eu entendo a minha consciência. Ter conhecimento e não distribuir, saber e guardar para si é o maior pecado que se pode cometer, pois a ignorância sempre foi a maior das pobrezas, a pior de todas as faltas. Consciência minha, sou todo seu!

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