Há muitos segredos que se escondem por aí nas entranhas da terra, no abismo úmido dos mares, nos assentamentos de estrelas espalhados no céu. Um desses segredos foi-me revelado numa das poucas e prazerosas conversas de fim de tarde, num raro descuido da TV. O caso prendeu a atenção de todos. Um senhor, exibindo no rosto a experiência de vários anos, afirmou que, como tudo na natureza, as águas dormem. Isso mesmo! Por um curto período da noite, elas esquecem a sua carreira, diminuem a sua fúria, se acalmam e adormecem. E o fato pode ser notado por todos aqueles que têm sensibilidade.
Exibindo mais detalhes, o enigmático senhor narrou a época em que morava próximo a um grande rio. Com voz nostálgica, num tom de mistério, afirmou que a cem metros de sua cabana o rio se precipitava numa cachoeira e o estrondo se espalhava pela mata cobrindo todos os outros ruídos. Era necessário um tempo para se acostumar a viver ali, convivendo com esse constante murmúrio. Entretanto, quando chegavam as horas frias da madrugada, aquela louca canção emudecia. O rio continuava seguindo, as águas continuavam caindo, mas não se ouvia o mínimo sussuro por um longo e inquietante minuto.
Quem para para observar, se arrepia quando chega o momento. O choro da cascata se distancia, se aquieta, dorme por longos sessenta segundos. Nada se ouve, nem mesmo o piado das aves noturnas. Parece que a natureza respeita esse instante de descanso das águas. Se a cachoeira fosse mais distante, argumenta o senhor, o fenômeno poderia ser explicado pelo vento que muda a direção. Nada disso! E o silêncio acontece todas as noites, sempre às altas horas da madrugada. “Se nós, seres humanos, precisamos em média de sete a oito horas de sono por dia, por que não conceder, pelo menos, um minuto a elas?” Foi seu arremate. É algo para se pensar.
Agora eu estou aqui pensando. Sabe, eu acredito no silêncio das águas. Talvez em solidariedade àquele senhor, em respeito aos seus cabelos brancos, ou bem mais pela certeza do fato brilhando a todo tempo em seus olhos. Eu acredito no silêncio das águas...