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Espaço Cultural -

Pandora

Na mitologia grega, Pandora era uma mulher dotada de beleza inigualável. Feita à semelhança dos deuses imortais, recebeu a graça, a inteligência, a paciência, a meiguice e inúmeras outras virtudes. Sabendo disso, fico aqui pensando: que bom seria se as pandoras da Terra tivessem as qualidades da Pandora do Olimpo, mas infelizmente isso não acontece, pelo menos com aquela que conheço...

Vou contar a história desde o começo. Regularmente, no fim da tarde, eu me preparo e faço aquela tradicional caminhada. Meu percurso é um pouco diferente, passando por uma estrada de terra nas imediações da cidade, adentrando mais à frente uma vila até chegar ao lago, que contorno, e volto à minha casa. É na vila que meus problemas começam, pois lá encontro minha pandora. Todas as vezes me preparo, pois sei que ela vai estar à minha espera. Pandora é uma cachorra que nada tem de beleza ou meiguice, e o pior, parece não gostar de mim. Quando me aproximo do local, ofegante em meu passo lento, ela aparece sempre de um novo ponto e se lança em meu encalço. Já passei vários apuros com a danada em meus calcanhares.

Feia, da cor do barro quando se dá fundo a uma cisterna, ela é totalmente sem graça e, conforme diz o Chaves, não tem paciência comigo. Sei que defende o seu território, mas eu apenas passo e rapidamente. Hospitalidade, no entanto, não é o seu forte e ela rosna sua contrariedade, mostrando os dentes afiados, correndo em minha captura. Pandora abre sua caixa, deixando escapar todos os males que a mim deseja. Só se detém quando uma voz vinda da casa vizinha grita por ela. Aproveito e me distancio de olhos arregalados em sua direção. Ah, foi assim que descobri seu nome.

É sempre desse modelo. Quando vou me aproximando da vila, já olho no caminho à procura de uma pedra ou um pedaço de pau para me proteger. Arremesso tudo que está ao meu alcance em sua direção logo que a vejo. Já comprei até um estilingue na feira para maior segurança. É um grande embate que travo a cada tarde de caminhada. Parece que o barulho dos meus passos a incomoda. Por várias oportunidades, ela quase me alcançou; cheguei a sentir o seu bafo quente nas minhas pernas. Penso até se não seria prudente mudar o percurso para evitar o confronto com essa fera.

E agora há uma novidade. Depois de algum tempo de sossego sem encontrar Pandora em meu caminho, avistei-a anteontem em um cercado rodeada de filhotes. Se a minha adversária adquiriu a inteligência da deusa homônima, certamente irá instruir seus filhos para ajudá-la em minha perseguição. Aí ficarei em desvantagem numérica e a batalha estará perdida. Enquanto eles não crescem, passo sorridente, observando de longe o cercado, os filhotes e os dentes de Pandora. Brevemente contarei o desfecho da história.

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