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Papagaio metálico voador

Há dois anos, faleceu um grande amigo meu. Companheiro em tudo: pescaria, futebol na TV, jogo de baralho, almoço do domingo... Gente boa, mas com a idade avançada, reclamava de quase tudo que não casasse com suas ideias. Uma de suas marcantes características é que não gostava de barulho, principalmente de propaganda volante. Quando os automóveis percorriam sua rua, anunciando uma promoção qualquer, o homem se irritava com o som sempre alto e exprimia sua contrariedade. Quem estava por perto se divertia com os xingamentos proferidos aos locutores que alegremente passavam anunciando as boas novas. Várias vezes, devido ao som um pouco mais elevado, o homem saía ao jardim gritando e acenando ao condutor do veículo. Não deixava sem troco a agressão ao seu valioso silêncio.

Lembro-me sempre dele. Hoje particularmente sua lembrança veio me fazer uma visita logo de manhã. Ao acordar, fui surpreendido por uma voz vinda do céu. Pensei que Deus tinha resolvido falar aos filhos mais diretamente, sem a intervenção de seus representantes. Não era coisa divina. Um avião, desses menores, sobrevoava a cidade derramando sobre nós a voz animada de um locutor informando as “benesses” que certa empresa oferecia à população. Uma excelente ideia, original, inédita na região. O alcance do comercial era muito maior. Enquanto os automóveis percorriam as ruas, de bairro em bairro, gastando horas para atingir toda a cidade, o danado do aviãozinho em poucos minutos dava o seu recado a todos por atacado. Uma maravilha!

Mas, e o meu amigo? Estou contando esta história por causa dele. Se estivesse vivo, com certeza não teria a mesma opinião a respeito dessa inovadora publicidade aérea. No mínimo, ele sairia no quintal e, depois de observar o papagaio metálico voador, lançaria em sua direção alguns adjetivos impróprios aos menores de idade, deixaria bem nítido seu aborrecimento a todos os presentes, criticaria as autoridades por permitirem nova agressão ao seu já perturbado sossego. E, finalmente, se refugiaria dentro de casa, fechando portas e janelas, fugindo do inimigo que agora atacava até pelo alto.

Meu amigo já se despediu e não passou por esse dissabor. Além disso não acompanhou, um a um, os sete gols da Alemanha sobre nossa seleção e, mais ainda, não amargou o desastroso resultado da última eleição para presidente. Teve sorte afinal de contas.

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