Hoje me sinto um vitorioso! E olha que não é fácil encontrar tempo na vida para sentir e cantar brados de ventura. Na verdade estamos, todos nós, mais ocupados em buscar forças para levantar e seguir, ainda cambaleantes pelos baques das quedas. Não é um pensamento colorido pelo negro do pessimismo ou pelo “automático” do desânimo. É a pura verdade. Claro que existem momentos de vitórias entre uma e outra abalroada da vida. Ainda bem.
E hoje eu me sinto assim, num desses raros e bons momentos. É que numa revista feita pela manhã em meu quintal - pequeno espaço de terra nos fundos da casa, cravejado por cinco ou seis árvores frutíferas - não encontrei zanzando vagarosamente por entre as folhas do chão um só costumeiro caramujo. Isso mesmo! Parece que a minha incessante luta contra esses asquerosos “não-sei-o-quê” – depois vou conferir no dicionário a espécie – teve resultado. Desde que apareceram por aqui há alguns meses, eu travo a mais ferrenha das batalhas de minha existência. Todos os dias bem cedo, ou quase todos, antes de sair para o trabalho, faço uma busca minuciosa, recolhendo e colocando-os num saco de lixo. Apesar de feios, nojentos e nocivos, não os mato.
Deixo que sigam outro destino.
Não é uma tarefa fácil como se poderia imaginar que fosse. Apesar de seu aspecto inofensivo e de sua extrema morosidade de locomoção, o bicho é quase imbatível. Ele se camufla com maestria, se embrenha nos buracos do terreno e nas fendas do muro, se acomoda debaixo dos galhos secos e das cascas soltas das árvores. E o pior: se multiplica numa espantosa velocidade. Parece que vivem só para fazer “aquilo”. Na verdade não sei se fazem, vou pesquisar também esse detalhe. O que importa é que quantos mais eu recolho, mais aparecem. Do grande e do pequeno. Subindo a parede, riscando a calçada com seu rastro meloso e imundo...
Mas a vitória chegou enfim. Quem sabe um triunfo momentâneo apenas, mas é um acontecimento digno de comemoração. Só encontrei uma “casinha” abandonada de um deles. É ou não é um motivo de extrema alegria? Pode ser que amanhã ou depois, após uma chuva que adoram, aqueles que por ventura estiverem hibernados apareçam. Tudo bem, a luta continua. Mas hoje vou abrir uma das minhas garrafas de vinho guardadas para ocasiões especiais como esta. Assim é a vida. É preciso sorrir entre uma tristeza e outra, aproveitar ao máximo a felicidade do momento fortalecendo-se para as próximas batalhas que certamente virão. Que venham os caramujos!