Eu era alegre. Muito alegre. Vivia sorrindo por aí. Minha alegria tinha pressa e, assim, a tristeza não me alcançava. Em casa, contagiava a todos com o bom-humor que os raios do sol faziam brilhar em meu rosto. No trabalho, minha animação espalhava-se pelos corredores e impregnava-se em todos os setores, atingindo em cheio os colegas. Na rua, um sorriso aberto levava a todos uma mensagem de otimismo e de amor à vida. Amigo triste não tinha sossego ao meu lado. Uma leva de traquinagens, causos e piadas espantavam qualquer encosto. Às vezes até exagerava um pouco, mas era sempre perdoado, já que é fácil perdoar excesso de felicidade. Aliás, tanta felicidade que era necessário repartir com as pessoas. Claro que havia momentos difíceis para mim também, mas eu os tratava com carinho, punha em prática o “Jogo do Contente” aprendido com a Pollyanna menina. Não havia remédio para a minha alegria.
Certa vez, e sempre tem uma primeira vez, o jogo falhou e não suportei o próprio ambiente criado por mim. Um riso aflito sustentava-se em meu rosto diante dos gracejos que recebia. Ninguém respeitava minha tristeza; eu não tinha o direito de chorar. Para onde me virava, parecia que alguém olhava para mim, sorria para mim, sorria de mim. E eu tinha que retribuir. Era proibido por ali sentir amargura, desilusão, desalento. Mas essas emoções existem e gritavam dentro do meu peito. Não havia aquele canto para ficar sozinho, nem por um pequeno instante, e eu nem podia me chatear; havia moldado assim o mundo à minha volta. Eu era o próprio exemplo da felicidade, e isso se revelou um fardo muito pesado. Não tinha graça nenhuma.
Compreendi nessa hora meu erro. Superei aquele momento de crise e mudei o jeito de ser. Hoje sou alegre, mas discreto; sou feliz na medida certa. Meu riso não ultrapassa um centímetro só da liberdade que todos têm de derramarem suas lágrimas. Hoje sei que ninguém tem culpa da minha alegria. Brincadeira só é bom na hora certa; graça só é bom até certa hora. Meu sorriso continua o mesmo, mas só aparece no rosto quando convidado. Penso que não deixei de colaborar para a felicidade das pessoas. Estou por aí, pronto àqueles que precisam de mim. Apenas deixei de sofrer de alegria. Sou mais feliz assim.